EVELYN DE MORGAN

EVELYN DE MORGAN

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

VIVER O PRESENTE

Viver preso ao passado pode ser uma forma

dolorosa de povoar o presente de rancores e

mágoas. Assim como instalar-se idilicamente no

futuro, é viver sobre hipóteses provavelmente

irrealizáveis. Então por quê não aprendemos a

viver no presente? Talvez porque viver no presente

exija concentração e somos dispersivos. Ou talvez

porque para viver o presente teríamos que ser

racionais e práticos, e somos afetivos e nostálgicos.

O presente nos intimida porque temos que ser

rápidos, temos que efetuar escolhas, apostar,

correr riscos... O que se viveu pode nos ajudar,

como também pode nos confundir nas decisões

presentes. O futuro não existe como tempo: não

passa de um ponto de interrogação contemplando

as reticências do passado. Quem sabe não seja por

causa de tudo isso que não saibamos viver com

alegria o tempo presente... O presente é o tempo

definitivo, onde se realizam as escolhas, que serão

ao mesmo tempo passado e futuro. O presente é

a nossa tragédia.


(YEDRA)

AMIGOS - OSCAR WILDE

Escolho meus amigos não pela pele ou outro
arquétipo qualquer, mas pela pupila.
Tem que ter brilho questionador e tonalidade
inquietante. A mim não interessam os bons de
espírito nem os maus de hábitos.

Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.
Deles não quero resposta, quero meu avesso.
Que me tragam dúvidas e angústias e

aguentem o que há de pior em mim. Para isso,
só sendo louco. Quero-os santos, para que não
duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela cara lavada e pela
alma exposta. Não quero só o ombro ou o colo,
quero também sua maior alegria. Amigo que não ri
junto não sabe sofrer junto.

Meus amigos são todos assim:metade bobeira ,
metade seriedade. Não queor risos previsíveis
nem choros piedosos. Quero amigos sérios, daqueles
que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem,
mas lutam para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os
metade infância e outra metade velhice. Crianças,
para que não esqueçam o valor do vento no rosto e
velhos, para que nunca tenham pressa.

Tenho amigos para saber quem eu sou.
Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios,
crianças e velhos, nunca me esquecerei de que
normalidade é uma ilusão imbecil e estéril.


(OSCAR WILDE)

O TEMPO E O VENTO

Toda a gente tinha achado estranho a maneira como

o capitão Rodrigo Cambará entrara na vida de Santa

Fé. Um dia chegou a cavalo, vindo ninguém sabia de

onde, com o chapéu de barbicacho puxado para a

nuca, a bela cabeça de macho altivamente erguida,

e aquele seu olhar de gavião que irritava e ao

mesmo tempo fascinava as pessoas... Montava um

alazão, trazia bombachas claras, botas com chilenas

de prata e o busto musculoso apertado num dolmã

militar azul, com gola vermelha e botões de metal...


(O Tempo e o Vento - Érico Veríssimo)

OS BONS E OS MAUS

A humanidade não deve ser separada entre bons e maus.

Esse dualismo conduz à discriminação, porque os bons

olharão os maus com superioridade, e os maus olharão

os bons com náusea. O que existe em cada ser humano é

uma mistura de bem e de mal; o mal prevalecendo quando

o bem é negligenciado. O que se altera e se intercala são

os atos dentro dessas duas condições. Ocorre dialética,

e não dualismo. O ser humano é dialético: vive a contradição

entre o bem e o mal durante toda a sua existência, através

de suas escolhas. Ele desafia a si mesmo. Tem potencial

para a grandeza e para o trágico. Sartre dizia que o homem

"está condenado a ser livre" - porque ele está condenado

a superar-se. Através da qualidade oposta, ele supera um

defeito. Pura dialética. Assim, ele consegue extrair liberdade

da dependência, audácia da timidez, entusiasmo do silêncio,

criatividade da inércia e extrair vida superando o tédio.

(YEDRA)

INSATISFAÇÕES PESSOAIS

Quando Thoreau afirmou qua a maior parte de

nós vive em silencioso desespero, não poderia ter

adivinhado como se tornaria mais intenso este

desespero. As pessoas dizem que querem ser

felizes; mas a verdadeira felicidade parece ser

o sonho impossível. O que estamos fazendo de

errado? Por que tantas pessoas estão insatisfeitas

de tantas maneiras? Será que esperamos coisas

demais? Ou não conseguimos nem ter as que

merecemos? Existe um jeito de ser feliz sózinho,

sem precisar dos outros? Talvez ninguém possa

nos dar felicidade se primeiro não a criarmos

dentro de nós mesmos. Precisamos aprender

a ser nós mesmos nosso melhor amigo. Se

conseguirmos aprender isso, teremos um

amigo para toda a vida.


(YEDRA)

SALMAN RUSHDIE

Durante muito tempo acreditei que em toda geração

há algumas pessoas felizardas ou malditas, que

simplesmente nascem sem vínculos. Que vivem semi

soltas no mundo. No entanto, há os convencionais que

temem a mudança, a incerteza, os que valorizam a

estabilidade, defendem as raízes e fingem se motivar

por lealdades, escondendo suas identidades secretas

no fundo da fachada satisfeita. Mas a verdade vaza em nossos

sonhos, neles flutuamos, voamos, fugimos.

A arte revela o vagabundo, o assassino, o ladrão, o

mutante, o renegado, o delinquente, o pecador, o fugitivo,

o viajante. Se não reconhecêssemos neles nossas necessidades

menos atendidas, não os teríamos inventado insistentemente,

em todas as línguas, em todos os tempos.

E esta espécie de gente que brinca de gostar de ficar em casa, que

se prende com vínculos, na realidade são sonhadores frustrados, que

chamam o oposto deles de loucos e anti-sociais.


(SALMAN RUSHDIE)

ESTILO PESSOAL

Todos nós com nossas experiências e nossas idéias,

criamos uma reputação, uma imagem, que se configura

num estilo pessoal. Nossa maneira de ser é uma forma

de auto-imagem que vendemos ao mundo. Através dela

criamos nossas relações e conexões sociais. O estilo é

a marca da individualidade, impressa em nosso

comportamento. Por isso se nota claramente, que as

pessoas sem estilo pessoal se perdem no todo, são

aquelas pessoas que falam o que todos falam, possuem

as mesmas idéias, alimentam os mesmos preconceitos,

realizam as mesmas coisas e sonham os mesmos sonhos.

Enfim, se contentam em andar pelos caminhos convencionais

e limitados pelo medo de ousar, não desenvolvem um

estilo pessoal.

(YEDRA)

VIRGINIA WOOLF

... num dia de verão, as ondas se juntam, balançam

e tombam; e o mundo inteiro parece dizer: "Isso é tudo",

cada vez mais forte, até que o coração, no corpo

estendido sob o sol da praia, também diz: "Isso é tudo".

"Não mais temas", diz o coração, confiando a sua carga

a algum mar que suspira coletivamente por todas as

dores, e recomeça, ergue-se, tomba. E o corpo sozinho

ouve a abelha que passa; a onda que se quebra; o cão,

lá longe, ladrando, ladrando...



(VIRGINIA WOOLF)

RUBEM ALVES

... há uma filosofia alegre, que nos faz levitar. Para

fazer levitar a filosofia não deve nascer da cabeça,

e sim das entranhas: o corpo estremece, ri, espanta-se,

tranquliza-se, assombra-se. O filosofiar amansa as

palavras. Também serve par pôr luz no escuro: quando

a luz se acende e o medo vai embora. Filosofia é

contafeitiço ... e há tantos feiticeiros e feiticeiras soltos

por aí, tão bonitos : é só acreditar para ficar enfeitiçado.

A filosofia nos torna desconfiados e quem desconfia

não fica enfeitiçado.


(RUBEM ALVES)

O MITO DA CAVERNA

Na alegoria do Mito da Caverna, Platão, numa linguagem

figurada, nos mostra uma imagem perfeita da atitude

filosófica. A caverna simboliza o estado do homem o

significado real das coisas, por falta de reflexão. Os

prisioneiros da caverna estavam cegos para a verdadeira

realidade. Acontece o mesmo conosco às vezes. Há

quem acredite que o mar é verde e o céu é azul. Ou

quando nos iludimso com as imagens de um filme se

movendo na tela. Até quando nos preocupamos porque

o tempo passa, sem nos darmos conta que somos nós

que passamos por ele. Vivenciamos a mesma sensação

de ofuscamento dos prisioneiros da Caverna de Platão,

quando a inteligência não consegue perceber a verdade

e admitimos a aparência como sendo a verdade. A atitude

filosófica contudo, é sempre despertada por uma necessidade.

Sem precisar de respostas dificilmente seremos compelidos

à reflexão.


(YEDRA)

terça-feira, 11 de setembro de 2007

DIZER VERDADES

Dizer o que pensamos é uma forma de liberdade; mas

para exercer essa liberdade certas regras se impõem.

Apesar de Camus ter afirmado que " liberdade é o

direito de não mentir", não somos livres a ponto de

sairmos por aí declarando "nossas verdades"

destemida e impunimente. Temos que levar em

consideração certas noções de hora e lugar, de

finalidade, além da vulnerabilidade dos ouvidos que

irão receber nossas "livres palavras". Gosto de uma

afirmação sobre a liberdade de expressão que diz:

" os que defendem a liberdade de expressão são

geralmente aqueles que querem abusar dele." E

"despejar" verdades ostensivamente é um grande

abuso.

(YEDRA)

A VIDA

É interessante perceber que espécie de conotação

cega a maioria das pessoas dá à vida. Muitas não

conseguem enxergar a verdade de que a vida é

mesmo difícil. A queixa persistente - ruidosa ou

silenciosa - em relação aos problemas existenciais,

obrigações intrínsecas e dificuldades de percurso,

demonstra a crença de que o "normal" seria a vida

ser mais fácil. Como disse Benjamin Franklin: " aquilo

que fere, também instrui". É por isso que as pessoas

mais sábias, aprendem a não temer e sim acolher os

contratempos, e, acima de tudo, conviver com a dor

dos problemas. A dor pode ser vivenciada de forma

produtiva, partindo da premissa de que " uma vez

conhecido o pior, estamos livres para ver o que há

de bom mais além."

(YEDRA)

JORGE LUÍS BORGES

Já somos o esquecimento que seremos,

A poeira elementar que nos ignora,

Que não foi Adão e que é agora

Todos os homens.

Somos apenas duas metades:

A do princípio e a do término.

Não sou o insensato que se aferra

Ao mágico som de seu próprio nome.

Penso com esperança naquele homem que

Não saberá o que fui sobre a terra.

Abaixo do indiferente azul do céu,

Esta meditação é um consolo.



(JORGE LUÍS BORGES)

FORÇA CRIADORA

PESSOAS - V. WOOLF

... quantas pessoas diferentes não haverá,

todas morando dentro da mesma pessoa?

Daí as mudanças assombrosas que vemos em

nossos amigos... esses eus de que somos constituídos,

sobrepostos uns aos outros como pratos empilhados

têm suas predileções, simpatias, pequenos códigos e

direitos próprios ... e cada pessoa pode multiplicar com

a sua experiência as diferentes condições que impõem

os seus diferentes eus - e algumas, de tão ridículas,

nem podem ser impressas em letra de forma.


(VIRGÍNIA WOOLF)

ENVELHECER - V.WOOLF

A compensação de a gente envelhecer era simplesmente

essa: que as paixões permanecem tão fortes como

antes, mas adquire-se - afinal! - o poder que dá o

supremo sabor à existência: oo poder de nos

apoderarmos da experiência e volteá-la, lentamente,

em plena luz... O passado nos enriquece e a

experiência, e o ter amado uma ou duas vezes,

pois se adquire o poder, que falta à juventude, de

ir direto ao fim, de fazer o que bem se entende, sem

dar importância aos outros, e de mover-se pelo

mundo sem grandes expectativas.


(VIRGÍNIA WOOLF)

SENSIBILIDADE

Existe em todos nós um potencial para a sensibilidade,

e mesmo que não possamos ser todos poetas, nos

tornamos poetas quando lemos um poema bem, porque

o sentimento já está dentro de nós e só é despertado

pelas palavras, que pairam flutuantes sobre a nossa

sensibilidade. " A poesia é uma espécie de música

insondável que nos leva à borda do infinito"; ela nos

deixa por momentos em estado de encantamento.

Os gregos, nas sua fábulas, falavam das harmonias

das esferas; era o sentido dado por eles à perfeita

estrutura de todas as coisas: tudo tendo a alma de

uma perfeita música. O poeta talvez seja aquele ser

especial que consegue pensar profundamente e "ver

musicalmente" as coisas que pensa.

(YEDRA)

SENSIBILIDADE