EVELYN DE MORGAN

EVELYN DE MORGAN

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

PHILIP ROTH

Combatemos nossa superficialidade, nossa falta de profundidade, de modo a tentarmos nos aproximar dos outros livres de expectativas irreais, sem uma sobrecarga de preconceitos, esperanças, arrogâncias, da fora menos parecida com o avanço de um tanque, sem canhão, sem metralhadoras e sem chapas de aço de quinze centímetros de espessura; a gente se aproxima das pessoas da forma menos ameaçadora, de pés descalços, em vez de vir rasgando o capim com as esteiras do trator, recebe o que elas dizem com a mente aberta, como iguais, de homem para homem, dizíamos antigamente, e mesmo assim a gente sempre acaba entendendo mal as pessoas. A gente também pode possuir o cérebro de um tanque. Já estamos entendendo errado as pessoas antes mesmo de encontrá-las, enquanto ainda estamos prevendo o que vai acontecer; entendemos errado enquanto estamos diante delas; e depois vamos para casa e contamos a alguém sobre o encontro, e de novo entendemos tudo errado.
Uma vez que a mesma coisa acontece com os outros em relação a nós, tudo vira uma ilusão desnorteante, destituída de qualquer percepção, uma espantosa farsa de incompreensões. E com tudo isso, o que é que vamos fazer a respeito dessa questão profundamente significativa que são as outras pessoas, que se vêem drenadas de toda a significação que julgamos ser a delase adquirem, em vez disso, um significado burlesco, o que vamos fazer se estamos tão mal equipados para distinguir os movimentos interiores e os propósitos invisíveis uns dos outros ? Será que todo mundo devia trancar a porta de casa e ficar quieto, isolado, como fazem os escritores solitários, em uma cela a prova de som. Invocando as pessoas por meio de palavras e depois sugerindo que essas pessoas feitas de palavras estão mais próximas das coisas reais do que as pessoas reais que deturpamos todos os dias com a nossa ignorância ? Persiste o fato de que entender direito as pessoas não é uma coisa própria da vida, nem um pouco, viver é entender as pessoas.
Viver é entender as pessoas errado, entendê-las errado, errado e errado, para depois reconsiderando tudo cuidadosamente, entender mais uma vez as pessoas errado. É assim que sabemos que estamos vivos: estando errados. Talvez a melhor coisa fosse esquecer se estamos certos ou errados a respeito das pessoas e simplesmente ir vivendo do jeito que der. Mas se você é capaz de fazer isso... bem, boa sorte.


( Philiph Roth - do livro Pastoral Americana )

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